29 de janeiro de 2007

Origem da expressão "dor-de-cotovelo"

Li na seção "Dito e Feito" da revista Aventuras na História, ed. 42, deste mês de Fevereiro, uma curiosidade que achei muito interessante. Então, resolvi divulgá-la aqui.
Caso se interesse pela revista, compre-a (eu recomendo). Quer ver como ela é? Simples: www.aventurasnahistoria.com.br


"Ter dor-de-cotovelo":



Utilizada para designar o despeito provocado pelo ciúme ou a tristeza de se ter sofrido alguma decepção amorosa, a origem da expressão "ter dor-de-cotovelo" está na clássica cena de alguém sentado em um bar, com os cotovelos apoiados no balcão enquanto mexe uma bebida em um copo e chora o amor que perdeu.

A expressão, incorporada pelos dicionários de língua portuguesa, se difundiu graças ao sambista Lupicínio Rodrigues. Lupe, como era conhecido, foi um mulherengo incorrigível. Usou suas diversas desilusões amorosas como inspiração para compor. Ele costumava classificar sua dor-de-cotovelo em três categorias, conforme a intensidade: a federal, que sempre acabava em um porre; a estadual, suportável; e a municipal, que não rendia sequer um samba. Praticamente todos os sambas de Lupe mencionavam a dor-de-cotovelo.

Lívia Lombardo

25 de janeiro de 2007

Sintoma de saudade.




Arrisco-me a diagnosticar: sintoma de saudade.Lembranças que tomam contam da minha cabeça e desnorteiam meu agir.Eu sei porque isso tem acontecido.É que nos últimos tempos,o presente tem sido "meio de gregro".Sinto falta dos meus amigos como jamais senti.Sinto falta de colo,de afago,de proteção.Fico me protegendo atrás dessa mulher moderna e independente e acabo por me sentir muito longe daquilo que realmente sou.
Deveria,talvez,me sentir mal por estar me expondo dessa maneira...Poderia até sentir-me mal se não soubesse que a diferença entre mim e os outros é que eu sinto e falo e os outros sentem e calam.Eu estou um pouco cansada das responsabilidades que tive que assumir muito cedo.Queria mesmo é ter passado mais tempo sob os braços dos meus verdadeiros amigos.Até sinto saudade das brigas que só hoje fazem sentido.
Não é uma questão de fraqueza - é uma questão de "franqueza de fragilidade".Tenho meus medos que me perseguem e que me afligem pelo peso de escolher certo.Obrigo-me a sempre acertar e erro por insistir em acreditar nesse poder não humano.Queria ouvir opiniões,queria apoio nas minhas decisões.Sinto-me sozinha para decidir sobre tanto de tudo...
Exijo-me a ser correta,exijo-me a perfeição.Tenho acabado meus dias esgotada de tanta tensão.Talvez esteja sentindo isso por ter me acostumado a ouvir o próximo longe do que eu realmente desejava...Diante disso,assumir o meu desejo poderia ser um sofrimento.Desaprendi a saber o que realmente representa o que quero porque tudo ficava tão misturado que minha individualidade desaparecia no meio de tanta gente.
A saudade que me aflige é da forma como as coisas eram encaradas,da simplicidade como já resolvi meus problemas e da comodidade de ter meus amigos disponíveis para o que desse e viesse.Tenho saudade da minha vida criança onde minhas preocupações giravam em torno do que faríamos à tarde quando as aulas já haviam terminado e a turma se reunia.
Sintoma de saudade é dor no peito,é choro fácil.É sonhar um reencontro,é acreditar que para isso o tempo voe.Estou numa reforma interior e isso requer muita paciência para quebrar o que impede a mudança e reconstruir novas pontes.Entretanto, olhar para os lados tem sido doloroso pelo vazio da saudade daqueles a quem amo...
Sintoma de saudade é ouvir músicas que relembram épocas,é sentir cheiros que nos carregam emoções,é reviver cenas.Pego-me reservando minutos do dia para dedicar-me a esses momentos que não voltam,mas me levam para o "bem passado"....
Sintoma de saudade é imaginar que a cada dia um dia tenho a menos.É lembrar que a velhice é certa e que não há negociação com a idade.Sintoma de saudade é de dor adoecida pela falta da presença,pela falta da falta.Sintoma de saudade causou em mim a doença da solidão.


Cristina Hahn.
Foto por: Teresa Sá.

24 de janeiro de 2007

Minha Namorada (Vinicius de Moraes)

Minha Namorada

Vinicius de Moraes

Composição: Vinicius de Moraes / Carlos Lyra

Meu poeta eu hoje estou contente
Todo mundo de repente ficou lindo
Ficou lindo
Eu hoje estou me rindo
Nem eu mesma sei de quê
Porque eu recebi
Uma cartinhazinha de você

Se você quer ser minha namorada
Ai que linda namorada
Você poderia ser
Se quiser ser somente minha
Exatamente essa coisinha
Essa coisa toda minha
Que ninguém mais pode ser
Você tem que me fazer
Um juramento
De só ter um pensamento
Ser só minha até morrer
E também de não perder esse jeitinho
De falar devagarinho
Essas histórias de você
E de repente me fazer muito carinho
E chorar bem de mansinho
Sem ninguém saber por quê

E se mais do que minha namorada
Você quer ser minha amada
Minha amada, mas amada pra valer
Aquela amada pelo amor predestinada
Sem a qual a vida ‚ nada
Sem a qual se quer morrer
Você tem que vir comigo
Em meu caminho
E talvez o meu caminho
Seja triste pra você
Os seus olhos tem que ser só dos meus olhos
E os seus braços o meu ninho
No silêncio de depois
E você tem de ser a estrela derradeira
Minha amiga e companheira
No infinito de nós dois

-------------

E, de brinde, a música tocada por Aderbal Duarte:




Magnífico!

22 de janeiro de 2007

Alma Errada

Há coisas que a minha alma, já mortificada não admite:
assistir novelas de TV
ouvir música Pop
um filme apenas de corridas de automóvel
uma corrida de automóvel num filme
um livro de páginas ligadas
porque, sendo bom, a gente abre sofregamente a dedo:
espátulas não há... e quem é que hoje faz questão de virgindades...
E quando minha alma estraçalhada a todo instante pelos telefones
fugir desesperada
me deixará aqui,
ouvindo o que todos ouvem, bebendo o que todos bebem,
comendo o que todos comem.
A estes, a falta de alma não incomoda. (Desconfio até
que minha pobre alma fora destinada ao habitante de outro mundo).
E ligarei o rádio a todo o volume,
gritarei como um possesso nas partidas de futebol,
seguirei, irresistivelmente, o desfilar das grandes paradas do
[Exército.
E apenas sentirei, uma vez que outra,
a vaga nostalgia de não sei que mundo perdido...

(Mario Quintana)

18 de janeiro de 2007

Devaneios.




"Para mim não importa a hora em que tu chegas em casa, no entanto que chegues bem. Não me importa saber com quem andas, mas sim que esses saibam te fazer sorrir. Me importo com a tua alimentação, com tuas noites não dormidas, com os teus horários. Não há importância para mim nos teus atos, desde que eu sinta que todos eles te realizam. E juro que não me importo de parecer assim a tua mãe. Me importo em te fazer feliz quando estamos juntos e não te fazer chorar quando vou embora. É importante ter certeza do teu bom dia. É importante não esquecer de te dar boa noite. É importante olhar para trás É importante não prometer. É importante cuidar de ti, querer o teu bem, proteger-se. É importante tomar decisões. É importante retirar dúvidas. É importante poder respirar. Não me parece importante o que os outros saibam, somente que tu compreendas. Com grande importância que te tenho aqui... assim. Nunca foste o mais importante, foste o único .
Importante para o coração, nos finais de semana, para curar. Importante na hora de tirar as dúvidas, de viver um bom momento, para existir. Tão importante que eu aprendi, vivi, te amei. Tão importante ao ponto de mais nada importar. Tão importante e capaz de entender que também sou importante. Vê, tu foste importante, és importante, serás importante pra sempre."

16 de janeiro de 2007

"Carinhoso", interpretada por João Gilberto

Uma obra-prima. Uma maravilha divina. Música composta pelo mestre Pixinguinha e pelo recentemente falecido Braguinha, que usava o pseudônimo "João de Barro" para que seu pai não o reconhecesse. Vale a pena vermos esse vídeo quantas vezes forem necessárias.

Carinhoso

(Pixinguinha e João de Barro)

Meu coração
Não sei porque
Bate feliz, quando te vê
E os meus olhos ficam sorrindo
E pelas ruas vão te seguindo
Mas mesmo assim, foges de mim
Ah! Se tu soubesses
Como sou tão carinhoso
E muito e muito que te quero
E como é sincero o meu amor
Eu sei que tu não fugirias mais de mim

Vem, vem, vem, vem
Vem sentir o calor
Dos lábios meus
À procura dos teus
Vem matar esta paixão
Que me devora o coração
E só assim então
Serei feliz, bem feliz

Se o poeta falar num gato


Se o poeta falar num gato, numa flor,
num vento que anda por descampados e desvios
e nunca chegou à cidade...
se falar numa esquina mal e mal iluminada...
numa antiga sacada... num jogo de dominó...
se falar naqueles obedientes soldadinhos de chumbo que morriam
[de verdade...
se falar na mão decepada no meio de uma escada
de caracol...
Se não falar em nada
e disser simplesmente tralalá... Que importa?
Todos os poemas são de amor!

(Mario Quintana)

14 de janeiro de 2007

Viciado em pensar

"Sou viciado em pensar. Penso besteira, mas penso."

- Ferreira Gullar, há alguns minutos atrás, em uma entrevista a Roberto D'ávila, na TVE Brasil.

13 de janeiro de 2007

besteira qualquer,eu nem choro mais.





Insônia.
O que me incomoda não é estar acordada numa madrugada de sexta-feira, enquanto o mundo ferve lá fora.Não é a cama ter um tamanho fora do normal e eu estar me mexendo nela de forma incessante , como se houvessem mil agulhas a furar meu corpo cansado.
O café frio já não tem sabor e não faz sentido levantar daqui e ir fazer um novo café , mais forte , encorpado.Café nenhum faria esses pensamentos desaparecerem.Talvez uma tequila fizesse.Talvez um filme interessante na televisão fizesse.Talvez se eu parasse de pensar e caísse num sono intenso , tudo ficasse melhor.
O que me incomoda não é escutar a gata no cio , gritando na rua vazia.Nem os bêbados cantando melodias baratas e antigas.Na verdade , bendito sejam os bêbados que saem as ruas e declaram seu amor a janelas desconhecidas , procurando a sua amada.Eu no auge dos meus vinte e um anos , deveria embriagar-me e ir até a sua porta ou janela , bater violentamente contra ela e dizer que você pode ficar com meus movéis, com meus objetivos para a vida , com meu cachorro , com aquela blusa velha.Você pode ficar com meus sonhos , com minha escova de dente , com meu computador , meus cd's , minhas cartas com inúmeras histórias e contas a pagar.Você pode ficar com todo meu patrimônio , com tudo o que conquistei ,contanto que devolva meu pensamento.Eu deveria esticar o dedo na sua cara , falar de forma grossa , deveria arrancar meus cabelos e dizer que vou esquecer esse seu maldito sorriso que acelera meu estúpido coração.Deveria dizer ainda mais que eu só caí nesse seu joguinho por pura piedade.Não foi nenhum sorriso , nenhum abraço , sequer um beijo doce no rosto que fizeram eu entregar minha essência a você.Eu deveria dizer isso e ainda cuspir na sua cara e dizer que a essas alturas do campeonato ,você só foi mais um.
Eu deveria.
Eu disse bem,eu deveria.
Mas prefiro aproveitar essa melodia triste , embriagar-me de um vinho barato ,olhar o céu escuro.Prefiro voltar a deitar na cama cheia de agulhas.Prefiro pensar que um dia,tudo vai ser diferente.
Mesmo que não seja.
"...vida não há sem dor."

10 de janeiro de 2007

Confissão De Cabôco










CONFISSÃO DE CABÔCO
Seu doutô, sou criminoso.Sou criminoso de morte.
Tou aqui pra mim intregá.
Voimicê fique sabendo:
- Quando a muié traz a sorte
De atraiçoá o isposo
Só presta para se matá.
Nunca pensei, seu doutô
Qui a mão nêga do distino,
Merguiasse as minhas mão
No sangue dos assarcino!
Vô li pidí um favô
Ante de vossamercê
Mim butá daqui pra fora:
- É a licença do doutô
Pr'eu li contá minha histora.
Sinhô dotô delegado,
Digo a vossa sinhuria
Qui inté onte fui casado
Cum a muié qui im vida
Se chamô ROSA MARIA.
Faz dez mês qui se gostemo,
Faz oito qui fumo noivo
Faz sete qui nós casêmo.
Nós casêmo e nós vivia
Cuma pobre, é verdade,
Mas a gente se sentia
Rico de filicidade!
Pras banda qui nós morava,
No lugá Chã da Cutia,
Morava tombém um cabra
Chamado Chico Faria.
Esse cabra, antigamente,
Tinha gostado de Rosa,
Chegaro, inté a sê noivo,
Mas num fizero a "introza"
Do casamento, prumode
Mané Uréia de bode,
Qui era padrim de Maria
Tê dismanchado essa prosa.
Entoce, o Chico Faria,
Adispois qui nós casêmo,
In cunversa, as vez dizia,
Qui ainda mi dava fim
Pra se casá cum Maria.
Dessa coisa eu sabia,
Mas nunca dei importança.
Tinha toda cunfiança
Na muié qui eu tanto amava,
Ou mais mió, adorava...
Cum toda a minha sustança!
Dispois disso, o meu custume
Era vivê trabaiando
Sem da muié tê ciume.
A muié pru sua vez
Nunca me deu cabimento
Deu pensá qui ela fizesse
Um dia um farcejamento.
Mas, seu doutô, tome tento
No resto da minha histora,
Qui o ruim chegô agora:
Se não me farta a mimora,
Já faz assim uns três mêis,
Qui o cabra, Chico Faria,
Todo prosa, todo ancho,
Quage sempre, mais das vêz,
Avistava o meu rancho.
Puralí, discunfiado
Como quem qué e não qué,
Eu fui vendo qui o marvado
Tentava a minha muié.
Ou tentação ou engano,
Eu fui vendo a coisa feia!
Pru derradêro eu já tava
C'a mosca detrás da uréia.
Os tempo foi se passando
E o meu arriceiamento
Cada vez ia omentano.
Seu dotô, vá iscutano:
Onte, já de tardezinha
O meu cumpade, Quinca Arruda,
Mi chamô pra nós dança
Num samba - lá na Varginha,
Na casa do mestre Duda.
Mestre Duda é um cabôco,
Um tocado de premêra.
É o imboladô de côco
Mió daquela rebêra.
Entonce Rosa Maria,
Sempre gostou de samba,
Mas, porém, de tardezinha
Me disse discunfiada,
Qui pru samba ela não ia,
Qui tava munto infadada,
Percisava se deita...
Eu fiquei discunfiado
Cum a preposta da muié!
Dispois qui tomei café,
Cuage puro sem mistura,
Cum a faca na cintura
Fui pru samba, fui sambá.
Cheguei no samba, dotô.
Repare agora, o sinhô,
Quem era qui tava lá?
O cabra Chico Faria.
Qui quano foi me avistando,
Foi logo mi preguntando:
- Cadê siá dona Maria,
Num veio não, pra dançá?
- Não sinhô. Ficô im casa.
Pru cabôco arrispondí.
Senti, entonce uma brasa
Queimano meu coração,
Nunca mais pude tirá
As palavra desse cabra
Da minha maginação.
Perdí o gosto da festa
E dançá num pude não.
O cabra, pru sua vez
Num dançava, seu doutô.
De vez im quando me oiva
Cum um oiá de traidô.
Meia noite, mais ou meno,
Se dispidino do povo
Disse: - Adeus, qui eu já vô.
Quando ele se arritirô,
Eu tombem me arritirei
Atraiz dele, sim sinhô.
Ele na frente, eu atrais.
Se o cabra andava ligêro,
Eu andava munto mais!
Noite iscura qui nem breu!
Nem eu avistava o cabra,
Nem o cabra via eu!
Sempre andando, sempre andando.
Ele na frente, eu atrais.
Já nem se iscutava mais
A voz do fole tocando
Na casa do mestre Duda!
A noite tava mais preta
Qui a cunciênça de Judá!
Sempre andando, sempre andando.
Eu fui vendo, seu doutô,
Qui o marvado ia tumando
Direção da minha casa!
Minha casa!... Sim sinhô!
Já pertinho, no terrero
Eu mim iscundí pru detraiz
De um pé de trapiazêro.
Abaixadim, iscundido,
Prendi a suspiração,
Abri os óio, os ouvido,
Pra mió vê e ouvi
Qua era a sua intenção.
Seu doutô, repare bem:
O cabra oiando pra traiz,
Do mermo jeito, qui faiz
Um ladrão pra vê arguém,
Num tendo visto ninguém,
Na minha porta bateu!
De lá de dentro uma voiz
Bem baixim arrispondeu...
Ele entonce, cá de fora:
- Quem ta bateno sou eu!
De repente abriu-se a porta!
Aí seu doutô, nessa hora
A isperança tava morta,
Tava morto o meu amô...
No iscuro uma voiz falô:
- Taqui, seu Chico, essa carta,
Qui a tempo tinha iscrivido
Pra mandá pra voismicê.
Pru favô num leia agora,
Vá simbora, vá simbora,
Qui quando chegá im casa
Tem munto tempo pra lê.
Quando minhas oiça ouviu,
As palavra qui Maria
Dizia pru disgraçado,
Eu fiquei amalucado,
Fiquei quage cuma loco,
Ou mio, cumo um cabôco
Quando ta chêi de isprito!
Dum sarto, cumo um cabrito,
Eu tava nos pés do cabra
E sem querer dei um grito:
- Miserave! E arrastei
Minha faca da cintura.
Naquela hora dotô,
Eu vi o Chico Faria,
Na bêra da sipurtura!
Mas o cabra têve sorte.
Sempre nessas circunstança
Os home foge da morte.
Correu o cabra, dotô
Tão vexado, qui dêxou
A carta caí no chão!
Dei de garra do papé,
O portadô da traição!
Machuquei nas minha mão,
A honra, douto, a honra
Daquela farsa muié!
Dispois oiando pra carta
Tive pena, pode crer,
De num tê prindido a lê.
Nas letra alí iscrivida
O qui dizia Maria
Pru marvado traidô.
Tive pena, sim sinhô.
Mas, qui haverá de fazê
Se eu nunca prindí a lê?
Maria mi atraiçuô!
Essa muié qui um dia,
Juêiada nos pé do artá
Jurou im nome de Deus
Qui inquanto tivesse vida,
Haverá de mim honrá
E mim amá cum todo amo.
Cum perdão do seu doutô.
Quando eu vi a miserave
Na iscurideza da noite
Dos meu oio se iscondê
Sem dêxá nem sombra inté
Entrei pra dentro de casa
Pra mi vingá da muié.
Douto, qui hora minguada!
Maria tava ajuêiada,
Chorando, cum as mão posta
Cumo quem faz oração.
Oiando pra eu pedia,
Pelo cali, pela osta,
Pru Jesus crucificado,
Pelo amo qui eu li amava
Qui num fizesse isso não.
Eu tava, doutô, eu tava
Cego de raiva e paixão.
Sem dizê uma palavra,
Agarrei nas suas mão,
Levantei ela pra riba
E interrei inté o cabo,
O ferro da parnaíba
Pru riba do coração!
Sarvei a honra, doutô,
Sarvei a honra, apois não!
Dispois qui vi a Maria
Caí sem vida no chão,
Vim fala cum vosmicê,
Vim cunfessá o meu crime
E mim intregá as prisão.
Se o sinhô num acredita
Se eu sô criminoso ou não,
Tá aqui a faca assarcina
E o sangue nas minhas mão.
Cumo prova da traição,
Tá aqui a carta, doutô.
Li peço um grande favô:
Ante de vossa-sinhuria
Mi mandá lá para prisão
Me lêia aqui essa carta
Pr'eu sabê cumo Maria
Perparava essa trição!
A CARTA
"Seu Chico:
Chã da Cutia.
Digo a vossa senhoria
Que só lhe escrevo essa carta
Pru senhor ficar sabendo
Que eu não sou a mulher
Que o senhor tá entendendo.
Se o senhor continuar
Com os seus disbiques atrevidos
O jeito que tem é contar
Tudo, tudo a meu marido.
O senhor fique sabendo
Que com seu discaramento,
Não faz nunca eu quebrar
O sagrado juramento
Que eu jurei nos pés do altar,
No dia do casamento.
Se o senhor é inxirido,
Encontrou u'a mulher forte,
O nome do meu marido
Eu honro até minha morte!
Sou de vossa senhoria,
Sua criada.
MARIA."
- Doutô! Doutô mi arresponda
O qui é qui eu tô ouvindo?
Vosmicê leu a carta,
Ou num leu, ta mi inludindo?
- Doutô! Meu Deus! Seu doutô,
Maria tava inucente?
Me arresponda pru favo!
Inocente! Sim, senhor!
Matei Maria inucente!
Pru que, seu doutô, pru que?
Matei Maria somente
Pruque num aprendi a lê!
Infiliz de quem num leu
Uma carta de ABC.
Magine agora o doutô,
Quanto é grande o meu sofrê!
Sou duas veiz criminoso,
Qui castigo, seu doutô!
Qui mizera! Qui horrô!
Qui crime num sabê lê!

9 de janeiro de 2007

Assim como todos os outros começos.

Era o que ela precisava. Um canto para lamber as feridas que não paravam de sangrar. Precisava tirar os sapatos, que insistiam em apertar os pés. Precisava descansar, dormir em paz. Precisava cozinhar, colocar flores na mesa, esperar (em vão) alguém chegar e abrir a porta alegremente. Precisava escutar música alta, dançar em frente ao espelho, rir da sua própria cara.
Precisava ver o pouco que tinha conquistado, num quarto, numa sala, numa cozinha (mesmo que o que tenha conquistado não enchesse sequer metade de um quarto). Mas ela precisava disso.
Acabou encontrando um lugar onde podia descarregar as idéias excessivas, que chegavam atormentando sua mente. Achou um lugar onde ninguém precisava entender o modo confuso que sua mente funcionava. Ela só precisava desabafar suas idéias, palavras soltas na mente, sentimentos, em um lugar seguro.
Então ela chegou, tirou os sapatos, sentou na cadeira. Olhou ao seu redor.
Descobriu que tinha a bebida para matar sua vontade. Descobriu que tinha música, para acalmar seu nervosismo. Descobriu que tinha um teclado e uma porção de idéias para jogar num cantinho especial.
Agora, só era preciso começar a contar a história esquecida, das páginas do livro que você insiste em jogar fora.

7 de janeiro de 2007

Versos de Catulo



Como um boi velho, cansado,
pacientemente a remoer,
que o capim verde, que come,
torna outra vez a comer,
hoje, velho, relembrando
minha alegre juventude,
tudo quanto já fruí,
como o boi, vou ruminando
o meu Passado saudoso,
que foi, em tempo ditoso,
o capim "verde" e cheiroso,
que quando moço, eu comi!
Mas, às vezes, a Saudade
acorda-me a Mocidade
com tanta exasperação,
que eu abro as duas porteiras
dos olhos, meu bom patrão,
e deixo que, atropelada,
saia, só numa arrancada,
toda a boiada das lágrimas
do curral do coração."

(Catulo da Paixão Cearense)


Saiba mais sobre Catulo aqui.


1 de janeiro de 2007

Bem, criamos esse blog menos para nos tornarmos escritores famosos de um blog cheio de visitantes diários do que para simplesmente desabafarmos sobre as decepções da vida, as tristezas causadas pela vida mundana ou pelos devaneios de cada um. Acho, pois, que nem precisaria citar sobre o que escreveremos aqui, visto que fica claro que os assuntos abordados serão decepções em relação ao amor, às amizades, às pessoas que nos causam raiva e asco, ao mundo e seu jeito de ser, enfim, as coisas da vida que nos façam querer escrever sobre.

Contudo, nem só de tristeza se fará esse blog. As coisas belas da vida, quando necessário, serão lembradas por aqui também, certamente.

Portanto, espero que gostem do que lêem aqui - e elogiem e dêem mais dicas caso o façam. E se não gostarem, critiquem-nos, por favor; fazemos questão de sermos criticados para podermos estar sempre nos aprimorando. Esperamos sinceramente que o blog agrade a quem o ler e que ele tenha uma longa e próspera vida.

Um abraço da equipe do blog.