
Paz, eu quero paz
sangrar.
Eu faço versos como os saltimbancos
Desconjuntam os ossos doloridos.
A entrada é livre para os conhecidos...
Sentai, Amadas, nos primeiros bancos!
Vão começar as convulsões e arrancos
Sobre os velhos tapetes estendidos...
Olhai o coração que entre gemidos
Giro na ponta dos meus dedos brancos!
“Meu Deus! Mas tu não mudas o programa!”
Protesta a clara voz das Bem-Amadas.
“Que tédio!” o coro dos Amigos clama.
“Mas que vos dar de novo e imprevisto?”
Digo...e retorço as pobres mãos cansadas:
“Eu sei chorar...Eu sei sofrer...Só isto!”
Mario Quintana
in Rua dos Cataventos.
Lembro-me o que fui dantes. Quem me dera
Não lembrar! Em tardes dolorosas
Lembro-me que fui a primavera
Que em muros velhos faz nascer as rosas!
As minhas mãos outrora carinhosas
Pairavam como pombas… Quem soubera
Por que tudo passou e foi quimera,
E por que os muros velhos não dão rosas!
São sempre os que eu recordo que me esquecem…
Mas digo para mim: “Não me merecem…”
E já não fico tão abandonada!
Sinto que valho mais, mais pobrezinha:
Que também é orgulho ser sozinha
E também é nobreza não ter nada!
Florbela Espanca - A mensageira das violetas
A luz desmaia num fulgor d’aurora,
Diz-nos adeus religiosamente…
E eu que não creio em nada, sou mais crente
Do que em menina, um dia, o fui… outrora…
Não sei o que em mim ri, o que em mim chora,
Tenho bênçãos de amor pra toda a gente!
E a minha alma, sombria e penitente
Soluça no infinito desta hora!
Horas tristes que vão ao meu rosário…
Ó minha cruz de tão pesado lenho!
Ó meu áspero e intérmino Calvário!
E a esta hora tudo em mim revive:
Saudades de saudades que não tenho…
Sonhos que são os sonhos dos que eu tive…
Florbela Espanca - A mensageira das violetas
Florbela Espanca - A mensageira das violetas